segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Carlos Drummond de Andrade visão de Clarice Lispector


Clarice,veio de um mistério, partiu para outro.Ficamos sem saber a essência do mistério.Ou o mistério não era essencial,era Clarice viajando nele.

Era Clarice bulindo no fundo mais fundo,onde a palavra parece encontrarsua razão de ser, e retratar o homem.

O que Clarice disse, o que Clarice viveu por nós em forma de história em forma de sonho de história em forma de sonho de sonho de história(no meio havia uma barata ou um anjo?) não sabemos repetir nem inventar.São coisas, são jóias particulares de Clarice que usamos de empréstimo, ela dona de tudo.

Clarice não foi um lugar-comum,carteira de identidade, retrato.De Chirico a pintou? Pois sim.O mais puro retrato de Clarice só se pode encontrá-lo atrás da nuvem que o avião cortou, não se percebe mais.

De Clarice guardamos gestos. Gestos,tentativas de Clarice sair de Clarice para ser igual a nós todo sem cortesia, cuidados, providências.

Clarice não saiu, mesmo sorrindo.Dentro dela o que havia de salões, escadarias,tetos fosforescentes, longas estepes,zimbórios, pontes do Recife em bruma envoltas,formava um país, o país onde Clarice vivia, só e ardente, construindo fábulas.Não podíamos reter Clarice em nosso chão salpicado de compromissos.

Os papéis,os cumprimentos falavam em agora,edições, possíveis coquetéis à beira do abismo.Levitando acima do abismo Clarice riscava um sulco rubro e cinza no ar e fascinava.Fascinava-nos, apenas.

Deixamos para compreendê-la mais tarde.Mais tarde, um dia... saberemos amar Clarice.

CLARICE LISPECTOR


Hoje minha escritora favorita completaria primaveras. Sua morte se deu no Rio, no dia 9 de dezembro de 1977, um dia antes do seu 57° aniversário.
Clarice fala de mim... Fala de nós... É imortal!!!
Ah! Pena não ter sido de sua época e ter tido o privilégio de conhecê-la.
Clarice era autêntica, tranparente, vivia exatamente o que a ponta de sua caneta deixava no papel...
Seus textos, pratas que enchem o coração e os ouvidos de ouro.
Graças a Deus temos suas obras, seu legado, seu melhor.
Tesouros que nos fazem relembrar e entrar no íntimo que ela nos conduz!
À você que não conhece, vou deixar aqui pequenas doses dos seus textos, algo com que me
identifico e amo!!!



"Eu acho que, quando não escrevo, estou morta."


"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..."


Clarice Lispector - Trecho de Perto do Coração Selvagem

_

Perco a consciência mas não importa,encontro maior serenidade na alucinação...É curioso como não sei dizer quem sou.Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer.

Sobretudo tenho medo de dizer,porque no momento em que tento falar não só exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que digo.Ou pelo menos o que me faz agir não é o que eu sinto,mas o que eu digo..."


Ideal de vida
“Um nome para o que eu sou, importa muito pouco. Importa o que eu gostaria de ser. O que eu gostaria de ser era uma lutadora. Quero dizer, uma pessoa que luta pelo bem dos outros. Isso desde pequena eu quis. Por que foi o destino me levando a escrever o que já escrevi, em vez de também desenvolver em mim a qualidade de lutadora que eu tinha? Em pequena, minha família por brincadeira chamava-me de ‘a protetora dos animais’. Porque bastava acusarem uma pessoa para eu imediatamente defendê-la. [...] No entanto, o que terminei sendo, e tão cedo? Terminei sendo uma pessoa que procura o que profundamente se sente e usa a palavra que o exprima.É pouco, é muito pouco.”



A certeza do divino
“Através de meus graves erros — que um dia eu talvez os possa mencionar sem me vangloriar deles — é que cheguei a poder amar. Até esta glorificação: eu amo o Nada. A consciência de minha permanente queda me leva ao amor do Nada. E desta queda é que começo a fazer minha vida. Com pedras ruins levanto o horror, e com horror eu amo. Não sei o que fazer de mim, já nascida, senão isto: Tu, Deus, que eu amo como quem cai no nada.”


A importância da maternidade

“Há três coisas para as quais eu nasci e para as quais eu dou minha vida. Nasci para amar os outros, nasci para escrever, e nasci para criar meus filhos. O ‘amar os outros’ é tão vasto que inclui até perdão para mim mesma, com o que sobra. As três coisas são tão importantes que minha vida é curta para tanto. Tenho que me apressar, o tempo urge. Não posso perder um minuto do tempo que faz minha vida. Amar os outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca [...].”


Amor/Deus

"Mesmo para os descrentes há a pergunta duvidosa: e depois da morte? Mesmo para os descrentes há o instante de desespero: que Deus me ajude... Venha, Deus, venha. Mesmo que eu não mereça, venha. Sou inquieta, ciumenta, áspera, desesperançosa. Embora amor dentro de mim eu tenha. Só que eu não sei usar amor: às vezes parecem farpas. Se tanto amor dentro de mim recebi e continuo inquieta e infeliz, é porque preciso que Deus venha. Venha antes que seja tarde demais."